Nada me faltará - Lourenço Mutarelli


 Por esses dias consegui terminar a leitura de “Nada me faltará”, de Lourenço Mutarelli. O livro é sobre a história de Paulo, um homem que em determinada fase de sua vida sumiu por um ano e retorno para o convívio social sem se recordar o período que esteve fora.

A história se desenrola com Paulo não lembrando de sua relação com a família. Ele tinha esposa e uma filha, que continuavam sumidas. Ninguém sabia o paradeiro, muito menos Paulo. Ele voltou e assumiu sua vida, mas enfrentou várias dificuldades com as funções sociais: trabalho, família e amigos.

Nesse ínterim uma ex-namorada, que havia ficado solteira passa a dar vazão a seus sentimentos e confessar que sempre gostou de Paulo. Ele, por sua vez, não se lembrava de sua esposa e filha. Em dado momento chegou a confessar que não se lembrava e nem sentia falta de sua vida anterior.

O interessante na obra é que Paulo passa a contestar o modelo de vida que tentam lhe impôr. O mais curioso é que tal modelo é, exatamente, o que ele era antes do ocorrido. Por isso, resolve não assumir nada do que lhe impõem e vai viver aquilo que considera importante.

Obviamente essa é uma ficção e mais um ensaio da menta genial de Mutarelli que, aliás, é exuberante não somente em seus desenhos, mas em seus roteiros e em suas atuações e direções. Enfim, um artista completo. Mas voltando ao livro... fica uma pergunta (pelo menos para mim). Já pensou?

Já pensou viver o que se acredita, de fato? Já pensou em largar família, emprego, amigos tudo e se “jogar” literalmente na vida? Isso é o que Paulo fez e certamente o que Mutarelli ou já fez ou pensou em fazer um dia.

Quem nunca passou por isso? Quem nunca aventou essa possibilidade? No fim das contas o mais importante da vida é viver. Nesse sentido, o título “Nada me faltará” faz conexão com essa vontade de viver o que se acredita. Por vezes a falta relaciona-se mais com os condicionamentos sociais e desejos introjetados em nós do que com reais necessidades.

Não sei se é coisa da minha cabeça ou uma leitura um tanto contaminada, mas o personagem Paulo não está nem aí para o sistema. Nem aí é força de expressão. Ele se utiliza do sistema quando lhe convém, mas não se torna refém dele. Mutarelli insere sua crítica não somente ao sistema estruturante, mas aos modelos dele decorrentes, pois todos os papéis sociais de Paulo são rechaçados e ele opta por viver o que, realmente, lhe dá prazer.

Não seria esse um caminho?

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