Por que Gilead teme o feminismo?

Margaret Atwood através de dois romances distópicos (O conto da Aia e Os testame


ntos) mostra que uma sociedade teocrática de viés machista é extremamente perigosa. O que levou a essa sociedade?

Os livros mostram que para se chegar a uma sociedade totalitária com forte acentuação machista e anulação da figura da mulher como autônoma, foi construído um discurso em cima de falácia e dissimulação de dados científicos, somou-se a isso a negação dos direitos das mulheres e homossexuais.

A democracia é um regime de conquistas e de permanente vigilância. Em “O conto da Aia” a personagem principal narra a atuação da esposa do comandante Waterford, Serena Joy.

“Naquela altura, ela já não cantava mais, estava fazendo discursos. Era boa oradora, sabia fazê-los. Seus discursos eram sobre santidade do lar, sobre como as mulheres deveriam ficar em casa” (ATWOOD, 2017, p.58).

Essa noção de que o lugar da mulher é no lar como cuidadora de filhos e submissa ao marido permanece até os dias de hoje em muitos lares. A gênese do machismo ainda está presente na sociedade de forma evidente. Há casos de mulheres que exercem as mesmas funções que os homens e ganham menos que eles. De igual forma há a negação do trabalho às mulheres, por exemplo.

Uma das primeiras medidas adotadas na república de Gilead foi a cassação dos direitos civis das mulheres e a negação do direito à leitura, sobretudo, das Aias.
Aia é um termo grego que significa escrava ou condutora. No caso do regime quando foi dado o golpe de Estado foi suprimido os direitos das mulheres. Um dos motivos é justamente o poder de interpretação teológico das mulheres.

Mesclando o romance com a realidade (que é o que Atwood faz) podemos entender o real motivo do temor do regime de Gilead em relação a uma interpretação feminista.



Ivone Gebara, teóloga feminista, sinaliza para a hermenêutica da suspeita com relação à totalidade machista. Para ela o século XX (com avanços em diversas áreas dos estudos) possibilitou uma abertura na interpretação de vários textos bíblicos. Vejamos:

“O século XX pode ser chamado de o século da suspeita feminina. Suspeita significa aqui a desconfiança e a dúvida em relação às afirmações tomadas como verdades absolutas em relação aos seres humanos e ao mundo. Suspeita em relação a um feminino dependente do masculino ou a um feminino considerado passivo e a um masculino considerado ativo. Suspeita em relação ao masculino beligerante criador da vida e da História e ao feminino passivo conservador e reprodutor da vida. Suspeita em relação à divisão sexual de espaços e de trabalhos. Suspeita em relação aos chamados papéis sociais supostamente estabelecidos pela natureza. Perguntamos: de que natureza se trata? De que feminino e que masculino falamos? Quem determinou suas características? Quem estipulou seus limites e papéis? Seriam eles imutáveis ou mutáveis? Seriam particulares ou universais?" (GEBARA, 2007, p.33).


Será que por serem argutas e críticas as mulheres da república de Gilead não pode ler? 

Comentários

  1. Então... eu tenho extremadas, amplas reservas com a rotulação "teólogo feminista". O que se está considerando, exatamente? O estudo de Deus e suas interações com a humanidade, ou a inserção do feminismo no meio da relação Deus-homem(tipo, não gênero)?
    A partir dessa reflexão, vejo como tem sido estéril a busca de Deus, modernamente. Estamos discutindo as migalhas que caem da mesa, ao invés da mesa em si, e a riqueza do que ela apresenta. Estamos nos atendo à pequenez das idiossincrasias de minorias desajustadas (sejam gays, mulheres mal amadas, homens hedonistas), e abandonando, decididamente, a busca do conhecimento de Deus.
    Alguém já escrevera "tempos difíceis forjam homens (e mulheres, claro! O produto do tempo não é privativo de um gênero!) fortes, que propiciam tempos fáceis, que forjam homens fracos".
    Ora, pois! Abraço!

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    1. Nesse caso é de um machismo extremo. Aí se faz importante o referencial feminista.

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