Pensando uma teologia profética


Pensando em alguma coisa de relevante e profunda retomei um capítulo de Enrique Dussel – um dos poucos, aliás, que tratam do tema da religião – em que o autor trabalha o tema da alteridade e analética para pensar algumas categorias. Nesse caso o tema em questão é a religião profética de Israel.

Em poucas palavras a analética em Dussel é o ponto exterior a dialética. Trata-se de um ponto fora da totalidade; exterior ao sistema. Toda sua filosofia é baseada nisso. A América Latina é a exterioridade do sistema europeu; os pobres são a exterioridade do sistema capitalista e assim por diante.
Em consonância com a proposta de Dussel. Está o livro de Pedro Santos “Os invisíveis da Terra em Deuteronômio”. Livro esse que traz a critica profética e inserção da categoria do pobres; viúvas; órfãos e os demais “invisíveis do sistema” para serem respeitados em sua dignidade e restaurados em suas necessidades.

Não é só uma metodologia teológica (crítica) que o filósofo se propõe a pensar, mas Dussel insiste numa leitura e visão de mundo quando concebe o próprio Deus de Israel como exterioridade e alteridade. Conforme expressa nessa afirmação:

“ [...] o Deus único de Israel – que com o tempo será único Deus de todo o universo – será sempre considerado como exterior ao cosmos criado, como que vindo do futuro e da exterioridade da criatura como tal.”(DUSSEL, 1977, p.155).

O Deus de Israel se coloca na exterioridade e é desde lá que se deve fazer a critica aos sistemas idolátricos fetichistas e totalizantes. A proposta de Deus para o povo de Israel, e posteriormente de Jesus para a igreja, é de uma práxis dialética em constante movimento (redundância proposital) que não se contém em mecanismo idolátricos. Como se sabe Israel não conseguiu levar à cabo essa proposta e por isso Deus levantou profetas e críticas ao sistema para que se voltasse para o propósito inicial.

“ Deus criador é alteridade com relação ao mundo, aos astros, aos homens; às nações e ao próprio Israel. Deus irrompe, interpela, chama, pro-voca desde a “exterioridade” para construir no ser, para reimprimir movimento histórico às “totalidades” que pelo pecado acabam por imobilizar-se em seu processo dialético” (DUSSEL, 1977, p.155).

Pecados estes que são de cunho individual e coletivo (estruturais). Perdendo essa dimensão a proposta de Deus como justiça não é praticada. Por isso em conjunto com a crítica profética é interessante retomar o estudo de Deuteronômio a partir da exterioridade: os invisíveis da Terra. Nas palavras de Pedro Santos:

“ Deuteronômio está interessado no homem israelita e nos seus múltiplos relacionamentos, e, nalguns textos, o livro mostra interesse naqueles que são denominados invisíveis da Terra. São eles: a viúva, o órfão, o estrangeiro, o escravo, a escrava, e, em certos casos, também o levita” (SANTOS, 2019, p.20).

Essas são as vozes exteriores de onde a teologia precisa ser pensada e pro-jetada. Se quisermos pensar uma verdadeira teologia crítica necessitamos colocar esses itens em pauta. No mais é idolatria.

Ref.
E. DUSSEL. Para uma ética da Libertação latino-americana IV. São Paulo. Loyola: 1977
SANTOS, Pedro
. E.C. Os invisíveis da Terra em Deuteronômio. Campinas: Saber Criativo: 2019.

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