Admirável mundo novo
Aldous Huxley é um autor que escreve com grande talento e
antecipa ( já em 1932) coisas que se vive em 2019, por exemplo. Sim. Estou me
referindo a “Admirável mundo novo”. Um dos livros distópicos mais famosos do
século XX.
Huxley fala de uma realidade futura imaginada; numa sociedade
compartimentalizada. Tudo nessa sociedade é organizado e gira em torno do
consumo. Na realidade descrita por Huxley as pessoas pertencem a um tipo de
casta e são fabricadas em laboratório – uma espécie de vida em série – nessa
divisão há castas altas e baixas. Todas possuem papeis determinados.
O autor é um profeta. Certamente não conheceu os “coach´s”
modernos e suas categorizações. Uma vez fiz um teste “mentoriado” por um coach.
Ele me disse: parabéns. Você é águia. Eu sou lobo. Eu indaguei: não entendi.
Ele me disse que cada pessoa – de acordo com o questionário em suas mãos –
correspondia a um animal e era catalogada por suas características. Por isso a
sociedade se orienta por adaptações. Mais ou menos o que Huxley coloca com as
categorias descritas em seu livro.
Na sociedade orientada pelo consumo não há espaços, por
exemplo, para abstrações e coisas que não girem no ciclo do mercado. Não há
estímulo para as relações interpessoais e nem para a valorização de
experiências coletivas (solidárias). A vida precisa ser vivida com o máximo de
individualismo.
Impossível não lembrar do velho Marx quando trata da
alienação. O sistema que "dopa" pessoas e as deixa especialistas em
pequenas coisas. É possível que um operário que trabalhou a vida toda em uma
fábrica seja especialista apenas em apertar parafusos. Assim como é possível que um
trabalhador da área de vendas seja especialista em convencer pessoas a comprar –
consumir – independente do produto.
A trama tem como um
dos principais personagens Bernard Marx. Um sujeito inquieto, que não se
conforma com o sistema tal qual ele é. Por isso procura alternativas, pergunta,
investiga e consegue ir para um outro local em que a civilização é tida como selvagem.
Lá encontra John, um homem que possui hábitos alheios aos do "Mundo Novo".
O primitivismo de John choca os habitantes do"Mundo Novo",
pois sua forma de ser é visceral, selvagem no stricto sentido da palavra. Ficam
as indagações: quem é mais selvagem? Uma civilização que despreza o belo, o
coletivo, os afetos ou quem segue seus instintos?
Há coisas na sociedade do "Mundo Novo" que chamam atenção. Uma
delas é a ingestão da soma – uma tipo de droga que serve para estabilizar as
pessoas. Se a pessoa se sente frustrada. Toma soma; se está depressiva. Toma
soma; se passa por qualquer fragilidade. Toma soma.
A relação que se pode fazer com a indústria farmacêutica nos
dias atuais é perfeita. Trata-se de uma verdadeira mina de dinheiro. As pessoas
na atualidade se tratam a base de remédios e drogas. Muitas delas são apenas
paliativos viciantes, que causam sensação de alívio momentâneo, mas não
resolvem o problema.
Outra questão abordada por Huxley é que a sociedade de
consumo avilta a natureza humana. O ser humano possui várias dimensões que
extrapolam a lógica de produção e consumo. Há dimensões existenciais,
artísticas, poética, lúdicas. Essas não são contempladas pela lógica do novo
mundo, pois não geram valor.
A sociedade retratada por Huxley é talvez a potencialização
máxima do toyotismo (produção em série nos EUA no início do século XX) se
levarmos a cabo a lógica em voga na sociedade chegaremos à conclusão que tudo
deve ser vivido em série. De certa maneira a sociedade já se organiza assim. Há
grupos distintos, mas todos seguem determinadas lógicas que caracterizam seus
gostos e comportamentos.
Diante de tudo isso falta espaço para valores primitivos que
caracterizam a existência humana. O cooperativismo, a solidariedade, o
respeito, a diversidade. É muito comum substituir pessoas por números. Essa é a
lógica social. O número dilui a identidade diante do todo. CPF, RG, PIS são
todas essas formas de tratar o humano da maneira mais impessoal possível. É
isso que Huxley mostra com maestria.
Quando na segunda parte do livro o personagem selvagem passa
a fazer contraponto à realidade da “civilização” evidencia vários descompassos,
que no fim rumam para o mesmo sentido. A humanidade precisa voltar a suas
origens e buscar em sua natureza seus valores mais nobres e até primitivos.
Aldous Huxley – Admirável
mundo novo.
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