Fotografia 3x4

Eu me lembro muito bem do dia que eu cheguei
Jovem que desce do Norte pra cidade grande
Os pés cansados e feridos de andar légua tirana
De lágrimas nos olhos de ler o Pessoa
E de ver o verde da cana

Muitos são os caminhos que levam uma pessoa a sair de uma cidade do interior rumo a uma metrópole. As dores se mesclam entre o físico e o existencial. Ler Pessoa, ter os pés cansados e ver o verde da cana lembram muito isso.
Memórias, sofrimento e trajetória.

Em cada esquina que eu passava um guarda me parava
Pedia os meus documentos e depois sorria
Examinando o 3x4 da fotografia
E estranhando o nome do lugar de onde eu vinha

Uma vez fui de Goioerê a São Paulo. Eu era parado em quase todos os postos policiais. Às vezes tinha a impressão de que os guardas paravam o carro para conferir se a cidade existia de fato. Sempre perguntavam: onde fica essa cidade? É interior, não é?

Pois o que pesa no Norte, pela lei da gravidade
Disso Newton já sabia: cai no Sul, grande cidade
São Paulo violento, corre o Rio que me engana
Copacabana, Zona Norte e os cabarés da Lapa onde eu morei

A vida de quem sai do interior para uma cidade grande é um verdadeiro contraste de realidades. Há muita coisa nova. Há coisas que são potencializadas. Os cabarés da Lapa dizem respeito à boemia.  O que é comum no Rio e em São Paulo e pouco comum no interior, por exemplo.

Mesmo vivendo assim, não me esqueci de amar
Que o homem é pra mulher e o coração pra gente dar
Mas a mulher, a mulher que eu amei
Não pôde me seguir não

Não se pode perder a ternura em tempo nenhum. O amor é sentimento nobre. A frieza de uma realidade hostil não pode endurecer o coração de ninguém. Outro ponto curioso é sobre a mulher que não pode seguir. A vida é feita de encontros e rupturas.

Esses casos de família e de dinheiro eu nunca entendi bem
Veloso, o sol não é tão bonito pra quem vem do Norte e vai viver na rua
A noite fria me ensinou a amar mais o meu dia

Quando eu morava em Resende o nascer e o pôr do sol se davam entre as montanhas. Depois que saí de lá nunca mais vi tal paisagem.  Entendo que amar o dia é melhor, pois a noite é um momento de reflexão e lembranças. Melhor mesmo preferir amar o dia.

E pela dor eu descobri o poder da alegria
E a certeza de que tenho coisas novas
Coisas novas pra dizer

Essa estrofe para mim pode ser definida através de uma palavra: amadurecimento.

A minha história é talvez
É talvez igual a tua, jovem que desceu do Norte
Que no sul viveu na rua

Vidas comuns. Histórias comuns.

E ficou desnorteado, como é comum no seu tempo
E que ficou desapontado, como é comum no seu tempo
E que ficou apaixonado e violento como eu como você
Eu sou como você
Eu sou como você
Eu sou como você que me ouve agora
Eu, eu sou como você
Eu sou como você
Eu sou como você
Eu sou como você
Eu sou como você
Eu sou como você

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